Este dia reservamos para explorar a região dos arredores do nosso hostel, passando em alguns pontos turísticos por ali como o Old Market, o templo Wat Preah Phrom Rath e alguns outros mercados menores. Acordamos cedo pra sair e aí vimos como foi importante ter ar condicionado no quarto. De manhã cedo já estava um calorão, bem mais quente do que estávamos acostumados na Tailândia.
Ainda não conhecíamos as ruas secundárias ali próximas que contavam com milhares de cafés e restaurantes então tomamos café na rua principal mesmo (a mesma que passamos no dia anterior). Na primeira carrocinha de rua que avistamos, que contava com várias mesinhas na calçada, experimentamos aqueles cafés da manhã tipicamente asiáticos que parecem um almoço (com massa, arroz e tudo que tem direito).
Devidamente alimentados, começamos então a desbravar a cidade. Primeiro seguimos até uma ponte próxima, que fica sobre o Siem Reap river, um rio que cruza toda a cidade. O rio (assim como as ruas) é muito mal cuidado, com bastante lixo e cheiro de esgoto, nos lembramos do nosso Arroio Dilúvio aqui de Porto Alegre. A ponte, só para pedestres, era bem simpática, e levava até o outro lado (é mesmo?) onde fica um mercado de artesanatos.
Demos uma olhada rápida pois como iríamos passar pelo Old Market, não queríamos tomar um fartão de mercados logo de cara. Outra coisa que nos chamou a atenção que agora de dia pudemos perceber melhor é o trânsito extremamente caótico da cidade. Falavam que a Ásia toda era uma terra sem lei no trânsito, mas na Tailândia, não sentimos tanto isso. No Camboja agora sim: Existem mais scooters do que habitantes em Siem Reap e coisas simples como respeitar o sentido das ruas não existe, tu anda do lado que tu quiser e entra na rua que quiser (acho que nem existe esse negócio de mão única, mão dupla, vai na fé). Sinaleira (semáforo) só vimos uma na Avenida principal que passamos quando fomos para o Angkor Wat, o resto das ruas é quem se enfiar primeiro vai. Mas, apesar da maioria dos carros que observamos sempre terem marcas de batida e inclusive termos presenciado algumas batidinhas entre carros e motos, para o pedestre é bem tranquilo, eles respeitam e, também pelo caos no trânsito e pelo estado das motinhos, não se vê muitos condutores correndo nas ruas, só é preciso olhar para todos os lados possíveis (e impossíveis) antes de atravessar uma rua.
As milhares de motinhas no trânsito caótico de Siem Reap
Seguimos então direto para o Old Market, o mercado principal da cidade, que conta com lojas estilo camelozão de artesanato, roupas, lembrancinhas turísticas, comida e etc. Lá é aquela mesma ladainha de sempre, tem que pechinchar para tudo, não existe isso de perguntar o preço e eles te dizerem de cara. Diferente da Tailândia, aqui nem preço inicial tem, a primeira coisa que eles perguntam é: how much you pay (quanto você quer pagar?)? E também são mais "agressivos" que o vizinho, ficam te puxando e baixando o valor até depois que tu já tá a metros da loja (3 dólares, 2 dólares, 1 dólar...), mas na verdade chega a ser engraçado porque normalmente a vendedora é uma mocinha que fica fazendo cara de coitada pra ver se tu fica com pena e compra. Tu passa o tempo inteiro falando orkum (obrigado em khmer). E pior que quando tu desvia das lojinhas e pisa na rua aí vem os motoristas de tuk-tuk te oferecerem tudo que é tipo de porcaria.
Compramos umas lembrancinhas no mercado e obviamente fui atrás da camisa da seleção de futebol do Camboja para comprar e, por mais que a seleção do Camboja nunca tenha passado da primeira fase das eliminatórias asiáticas para a Copa, a camisa da sua seleção é vendida abundantemente em cada esquina, além de você ver na rua muita gente local a usando, principalmente os motoristas de tuk-tuk, vendedores e outros trabalhadores de rua. O futebol é bastante popular no país e, assim como as ligas tailandesa e indiana, a liga nacional do Camboja tem crescido bastante nos últimos anos. Com a facilidade pra achar a bendita camisa, só pra contrariar, acabei comprando ela da única vendedora que não parecia estar muito disposta a negociar, só me deu o preço fechado (9 dólares), comprei e deu.
Depois fomos conferir onde ficava a parte das comidas do mercado. Já estávamos esperando um lugar com uma higiene no mínimo duvidosa, mas como na época ainda não conhecíamos os mercados do Perú, tomamos um choque com a porqueira daquilo ali. Pessoal limpando os bichos (porco, galinha, peixe) tudo em cima dumas pias, do lado de onde serviam as comidas para os clientes. Gatos passando pelas mesas e lambendo os peixes, açougueiro/vendedor com os pé sujo em cima da mesa fumando enquanto cortava uns pedaço de porco (moscas então nem se fala). Mas mesmo com tudo isso achei um lugar muito legal para passear e observar o movimento dos locais e só não comemos ali porque ainda estávamos cheios do café da manhã.
Depois do passeio pelo mercado seguimos para o templo Wat Preah Phrom Rath (eita), um dos templos mais famosos de Siem Reap, que fica a duas quadras do Old Market e com entrada grátis. O lugar é um oásis no meio do tumultuado centrinho da cidade, bastante paz e silêncio com seus prédios e jardins muito bem decorados, coloridos e limpos.
O belo templo Wat Preah Phrom Rath
Bem na entrada tem umas esculturas representando uma das mais famosas passagens da história do Buda, história essa que vimos ilustrada com desenhos nas paredes da grande maioria dos templos que visitamos, porém neste foi a primeira vez que vimos ela representada por esculturas: a passagem que mostra o príncipe Sidartha (o Buda), numa viagem de carruagem fora do seu palácio, se deparando na estrada com um homem morto no chão com seu cadáver envolto em urubus e vermes comendo seus restos. Segundo os escritos foi ali a primeira vez que o Buda descobriu que existia morte, pois até então ele viveu sempre protegido e separado do mundo exterior em seu castelo, com seus pais e súditos sempre tratando de esconder dele o conhecimento da existência das mazelas do mundo, inclusive a existência da morte. A escultura em si não chega a ser mórbida, apesar do tema, é até meio engraçado os bonecos e bem colorida.
Representação de uma das passagens da história do príncipe Sidartha (o Buda)
Passando pelos jardins decorados se chega então ao templo principal do complexo, que contém uma estátua de buda no estilo khmer, bem diferente dos templos tailandeses. Atrás do altar ainda se deparamos com um buda reclinado dentro de uma espécie de sarcófago, também em estilo cambojano, bem interessante.
Buda estilo khmer que conta com um buda reclinado "escondido" atrás
Ao redor do templo principal ficam também diversas ilustrações bem bonitas representando os ensinamentos budistas. Lembro que neste templo especificamente as figuras contavam a história de um pescador que encontrou mais tarde a iluminação se tornando um Buda. Não lembro agora da historinha mas sei que tinha achado ela bem bonita.
Já do lado de fora ao lado esquerdo do jardim se tem uma edificação bem bonita que agora é uma escola budista e uma biblioteca.
Depois da visita ao templo seguimos meio sem rumo pela rua que margeia o rio Siem Reap. Essa rua, apesar do rio ser bastante sujo, é bem arborizada e junto com o rio dava uma amenizava no calorão que estava fazendo.
Rua que margeia o rio Siem Reap
E por falar em calorão, avistamos no caminho um shopping, o Angkor Trade Center, e resolvemos entrar para conhecer e aproveitar um pouco de ar condicionado. O shopping, se é que dá pra chamar assim, se tratava de um centro comercial com algumas lojinhas, bem simples e com um cinema que, assim como na Tailândia, era voltado pra estrangeiros e passava filmes com legendas em inglês.
Seguimos então pela rua às margens do rio. No caminho bastante pessoas aproveitando o local (inclusive tomando banho no rio), além de várias "excursões" de colégios, com um monte de crianças cambojanas muito fofas vestindo uniformes escolares (passamos por umas três turmas de colégios diferentes).
A medida que se aproximávamos de um lugar que parecia um parque com vários jardins envoltos por prédios que pareciam prédios públicos do governo, a rua ia ficando mais bonita, decorada com várias bandeirinhas do Camboja, além de cartazes com a foto do rei deles (sim, Camboja também é uma monarquia, mas eles não são tão fanáticos pelo rei como na Tailândia). Neste parque havia um palco montado com várias cadeiras de plásticos dispostas no gramado em frente, mas não tinha nenhum evento acontecendo ali no momento.
Chegando próximo ao Royal Independence Gardens, onde havia um palco montado para algum evento que ocorreria (ou ocorreu) ali e uma feirinha
Não descobrimos quem que ia se apresentar ali ou se já havia se apresentado em outro dia e estavam desmontando. Depois olhamos no google maps e descobrimos que aquele parque ali na verdade é o Royal Independence Gardens, um parque público bem agradável onde ocorrem vários eventos e feiras na cidade e fica em frente a uma das dependências reais e do prédio do governo de Sieam Reap, além de contar com alguns templos budistas também. É aqui também que se inicia a rua Charles De Gaulle, a principal rua de Siem Reap, que seguindo ela leva direto ao Angkor Wat.
Do outro lado da rua, em frente ao parque, passamos também numa feirinha que estava acontecendo ali. Essa era uma feira bem "modesta" digamos. Apesar de vender quase as mesmas coisas que o Old Market, incluindo milhões de camisetas de futebol, os produtos eram de uma qualidade bem inferior. As barracas também eram todas montadas com as coisas expostas no chão mesmo, sendo esse chão todo de terra, tudo meio embarrado (não preciso dizer que as mercadorias ficavam todas sujas e empoeiradas), as comidas vendidas também eram cozinhadas ali numas cozinhas improvisadas bem "roots".
Depois de ficar um tempo ali curtindo o parque e a feira, fomos seguindo a Charles De Gaulle até que passamos na frente do Museu Nacional, o Angkor National Museum que fica num prédio suntuoso, que se destaca na paisagem de Siem Reap.
A visita a esse museu, que é considerado um dos principais museus de história do Camboja e o que mais traz informações sobre a civilização khmer, estava no nosso roteiro como uma opção "se der tempo a gente vai", já que ele é bem caro pros padrões asiáticos (12 dólares a entrada) e ele não contém nenhuma informação sobre a história contemporânea do país, que é o que mais me interessava no Camboja. Além disso, como iríamos ao Angkor Wat, que já é um museu a céu aberto, deixamos o museu meio que de plano B.
Pois bem, como ainda era cedo e não estávamos gastando nem 5 dólares por dia em Siem Reap, resolvemos entrar no museu, e te digo que valeu muito a pena. O museu que também é um oásis em meio ao caos da cidade, como já dito, fica num prédio luxuoso que se destaca entre as demais edificações (ainda mais que fica a uma quadra da feirinha essa que passamos). Parece até que se está em um outro país.
A fachada "ostentação" do Angkor National Museum
Dentro também as instalações são muito bem adornadas e ostensivas. Mas além da beleza, as exposições e as informações históricas são riquíssimas e sensacionais, além de possuir bastante conteúdo interativo como vídeos por exemplo. Tem alguns outros jogos também que nós não entendemos direito, só fizemos um que você balança um jarro com palitos de madeira com dizeres e o que cair primeiro é a sua sorte do dia (não lembro o que caiu para nós). Dá pra ficar o dia inteiro no museu, deu pra aprender bastante sobre a cultura khmer, seus rituais e sobre a religião hinduísta com seus três deuses: sheeva, brahma e vishnu. Bastante coisa também sobre o Angkor Wat. Deu muito certo termos visitado este museu antes da visita ao templo pois acabamos apreciando muito mais, sabendo o significado das construções e como aquela civilização vivia ali.
Infelizmente, não se pode tirar fotos dentro do museu, só conseguimos tirar essas aí, numa "piscina" que fica dentro do prédio e eu me passando por khmer puxando a serpente
Saímos do museu morrendo de fome, já que não tínhamos almoçado ainda e já era fim de tarde. Fomos voltando pela avenida de trás do museu (que é a mesma rua do nosso hostel e aquela primeira que visitamos no dia que chegamos), até chegar numa região cheia de restaurantes caseiros um do lado do outro. Experimentei por ali então o meu primeiro khmer amok, o prato nacional do Camboja que eu estava ansioso para provar (acompanhado de uma cambodian beer, é claro). E este prato é muito bom! Um cozidinho de carne com leite de coco servido normalmente numa folha de bananeira na hora se tornou meu prato preferido de toda a viagem. E o melhor é o preço! Em todos esses restaurantes que pesquisamos era assim: prato normal é 1 dólar, mais elaborado é 2 dólares, e é isso os preços (só a carne de sapo que no fim não conseguimos experimentar que era 4 dólares, o prato mais caro dos lugares ali).
Provando pela primeira vez o Khmer Amok acompanhado de uma Cambodia Beer (a Juju não quis arriscar e foi de hambúrguer...)
À noite fomos conhecer "de verdade" a Pub Street (no dia anterior só tínhamos dado uma passada rápida).
A rua é uma Khao San Road mais light (menos muvucada), dominada por turistas bebendo e fazendo festa como se estivessem na casa da mãe joana e com todo aquele comércio voltado para turistas: venda de "petiscos" de escorpião, cobra, gafanhoto, etc. Pessoal te oferecendo drogas na cara dura e bares "para gringos".
Pessoal vendendo escorpião, larvas, gafanhotos entre outros "petiscos" engana turista e dois "bares pra gringos" bem conhecidos, o Cheers e o Angkor What?
Mas apesar disso os preços ali são absurdamente baratos e meio que tabelados. Por mais chique que o bar fosse, caneco de cerveja sempre custava 50 centavos de dólar!! Bastante variedade de comidas também de vários lugares do mundo, com destaque para o cambodian barbecue, que ficamos de comer em outro dia.
No lugar também fica o Red Piano, um bar que é famoso por ser o preferido da Angelina Jolie, inclusive tem um drink chamado Angelina Jolie e um cartaz com fotos dela lá. Pra quem não sabe, a atriz visitou o país quando foi gravar Tomb Raider e se apaixonou! Inclusive um dos trocentos filhos adotados dela é cambojano. Ela também produziu junto com o filho recentemente um filme muito bom (e pesado) chamado First they Killed my Father (primeiro eles mataram o meu pai) que conta a história do advento do regime de terror do khmer vermelho no Camboja. Recomendo!
Como tínhamos agendado com o Phey para o outro dia às 4h da manhã a visita ao Angkor Wat para ver o nascer do sol, não nos estendemos muito e fomos cedo pro hostel. No caminho ainda passamos no Art Center Night Market, aquele mesmo mercado de artesanatos que fica do outro lado do rio que havíamos ido pela manhã, mas que agora de noite estava muito mais cheio e bem bonito iluminado.
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